Este
tema já foi abordado parcialmente por um autor muito conhecido no meio
evangélico, chamado Francis Schaeffer; sua abordagem está demasiadamente fundamentada
nas Escrituras e, deverá ser através dela que toda a cosmovisão de uma artista
cristão se pautará para analisar a mensagem que a arte evidencia em sua
exposição.
“Mesmo a cosmovisão que diz não existir significado
transmite uma mensagem. Seja como for, esteja o artista consciente da
cosmovisão ou não, se ela estiver presente, deve ser submetida ao julgamento da
Palavra de Deus. (SCHAEFFER, 2010, p.56)”
Mesmo
Sendo secular, a arte também está impregnada por uma religiosidade inerente a
todo o ser humano como formatado na criação em Gênesis 1.27, há uma
conformidade no pensamento de Schaeffer ao analisar uma arte, pois para ele não se deve jogar
tudo fora, deve ser avaliado o dom/ talento do artista e sua cosmovisão
transmitida em sua arte, “[...] A verdade
de uma cosmovisão apresentada por um artista deve ser julgada à parte de sua
grandeza artística.” (2010, p. 53)
A
análise de uma obra artística não pode ser analisada dogmaticamente em se
tratando de um diálogo público sobre a importância da arte como expressão
pública/ secular.
A
arte secular deve ser observada e analisada, não pelo valor, ou pelo nome do artista
que a confeccionou, mas pelo simples fato de saber que houve uma expressão
artística envolvida, seja na música, na escultura, no teatro, na dança, todas
estas expressões devem ser analisadas como arte, onde sua expressão está sendo
comunicada e constituída. Os irmãos Janson em seu livro Iniciação à História da Arte:
A
arte nos dá a possiblidade de comunicar a concepção que temos das coisas
através de procedimentos que não podem ser expressos de outra forma. Na
verdade, uma imagem por mil palavras não apenas por seu valor descritivo, mas
também por sua significação simbólica. Na arte, assim como na linguagem, o
homem é sobretudo inventor de símbolos que transmitem ideias complexas sob
formas novas. Temos que pensar na arte não em termos de prosa do cotidiano, mas
como poesia, que é livre para reestruturar o vocabulário e a sintaxe
convencionais, a fim de expressar significados e estados mentais novos, muitas
vezes múltiplos. (JANSON, H. W. & JASON, 1996 p.7)
Schaeffer
afirma “Nem toda a criação é uma nobre
expressão de arte” (2010, p.45). A moralidade não deve está baseada em um
único princípio religioso, o que é expressão nobre para um, poderá não sê-lo a
outrem. A arte secular deve se desvincula de um olhar religioso sobre o objeto
de estudo, que neste caso é a arte. Mas como podemos analisar uma arte secular,
se já estamos com um pré-julgamento sobre a obra do artista, pois as Escrituras
dirão que são válidas ou não? Será que a dogmática dará este respaldo para
analisarmos se uma obra secular é importante e interessante?. Schaeffer não
está criticando a arte secular, e nem tão pouco desprezando o artista secular,
contudo dimensiona isso tudo a uma análise bíblica e final, diante disso
dogmatiza a forma como a arte em exposição deve ser analisada.
Temos
a bíblia como uma leitura do mundo e temos as artes seculares como leitura do
mundo também.
“[...]
ao abordar a relação entre teologia, arte e cultura, é imprescindível manter-se
ciente de que essas três “grandezas” são, cada qual a seu modo, leituras de
mundo, expressões de uma interpretação da realidade e da vida humana com suas
interações, vicissitudes, experiências, medos, anseios e descobertas.” (REBLIN,
2012, p.187).
Sendo
a teologia uma arte, sua cosmovisão basear-se-á na bíblia e na metafísica, no
ser sagrada, contudo temos que “ressaltar
que a teologia é um saber humano e que, enquanto tal, está intimamente vinculada
a arte de viver” (2012, p.189). O serviço da teologia deve contribuir para
um entendimento das diversas manifestações religiosas da população, “[...] não enquanto expressão de fé no
sentido de uma espiritualidade a ser sentida/ experiênciada [...]” (REBLIN, 2012, p.189).
A
história tem uma relevância experiencial significativa quando “[...] as produções culturais são o palco
onde as histórias herdadas e lidas e as experiências vividas e ouvidas
emergem.[...]” (REBLIN, 2012, p.193).
Deveria
ser nesta perspectiva que a teologia deverá ver a cultura no Brasil. Vejamos a
cultura fluminense (carioca), onde o carnaval é vivenciado quase que
diariamente por aqueles que são responsáveis por sua formulação e, para outros
o sangue começa a pulsar no mês de janeiro e vai até o final do mês de
fevereiro. É por essa razão que a
teologia deve seguir um caminho menos dogmático, possuindo uma melhor leitura
do mundo. “Enquanto ciência humana, a
tarefa da teologia em relação a arte e em ralação as produções culturais não é
impreterivelmente a aplicabilidade de formulas ou conceitos, nem a preleção de
sermões, mas a compreensão do mundo humano [...]” (REBLIN, 2012, p.194).
Culturalmente
no Rio de Janeiro vive-se o carnaval. Contudo temos que buscar um entendimento
mais profundo dos motivos que levaram os evangélicos a demonizar tudo que está
envolvido no carnaval. Por que se construiu esta imagem de uma arte está
mundanizada, demonizada? Por que não conseguem ver o carnaval como uma arte,
como a expressão de um povo, como o esmero do artista em tornar sua cosmovisão
elucidativa para todos aqueles que estão observando os blocos, os carros
alegóricos das escolas de samba, a letra da música, a rima, o teatro encenado
pelas comissões de frente das escolas de samba, as baterias, as fantasias, as
cores, a beleza?
“A
tendência de instituições e academias donas do capital simbólico religioso é
antes ler essas expressões, expropria-las, dar-lhe uma nova roupagem e
reapresenta-las ao locus de onde
emergiram para manter o controle sobre o capital.” (REBLIN, 2012, p.194)
O
capital religioso formata a mente de muitos cristãos, instalando novos
conceitos, que rechaçam qualquer evidencia do passado antes de serem “novas
criaturas” como sendo as mais terríveis experiências vivenciadas. Cabe uma
pergunta, a vida antes de serem “novas criaturas” sempre foi negativa? Compor
música, por exemplo, é a mais terrível condição humana por ter sido praticada
quando não estava inserido em um mundo religioso diferente ao que está vivendo?
Uma composição em uma escola de samba o impede hoje de compor por ter sido uma
prática “mundana” no passado? Dançar, tocar, confeccionar esculturas, se
caracteriza por uma experiência ruim, por ter sido exclusivamente praticada na
sua vida “mundana”?
Por
que esta dicotomia, entre fé e cultura, vem sendo instalam como um antivírus
para combater toda e qualquer manifestação cultural, este antivírus da
bibliolatria se caracteriza por bloquear toda expressão humana evidenciada no
mundo, e deletada imediatamente da mente de todo o cristão por ser conteúdo
“malicioso”.
A
teologia deve ser uma práxis libertadora. “[...]
Quantas vezes não se usou e abusou dessa dicotomia maniqueísta e anti-bíblica
de que o espiritual não tem nada a ver com temporal, [...]” (Zabatiero, 2011,
p. 97)
Bibliografia
SCHAEFFER,
Francis A. A arte e a Bíblia; tradução Fernando Guarany Jr. – Viçosa, MG:
Ultimato, 2010.
REBLIN,
Iuri Andréas. Teologia, arte e cultura: os caminhos da teologia do cotidiano. In. Eneida Jacobsen,
Rudolf von Sinner e Roberto E. Zwetsch. Teologia
Pública: desafios sociais e cultura. São Leopoldo: Sinodal/ EST, 2012, p. 181-200.
ZABATIERO,
Júlio. Para uma Teologia Pública. 2ª edição. São Paulo: Fonte Editorial,
Faculdade Unida, 2011. p. 95-113.
Silvino Neto
Parabéns Silvino pelo Blog e pela vocação de escrever e refletir sobre vários assuntos. Glória seja dada a Deus.
ResponderExcluirObrigado José Maurício.
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